segunda-feira, 17 de agosto de 2009

Cine de Vita

Aristóteles defende que a arte deve ser verosímil. Mais do que ser verdade ou um decalque da realidade, ela deve parecer real, simples como os acontecimentos do dia a dia, com características que a tornem especial e única, mas que não ultrapasse a nossa noção de realidade.
Quando ocorreu o atentado às Torres Gémeas, muito se falou em a realidade ultrapassar a ficção. Mas quando é que a realidade ultrapassa a ficção? Como é que conseguimos perceber o mundo quando a nossa história de vida ultrapassa os nossos conceitos ficcionais? Quando é a nossa vida?
Existem momentos únicos na vida de cada um, às vezes um presente, uma festa surpresa, um encontro inesperado, uma revelação bombástica, a descoberta de uma traição, um príncipe, um vilão, Cassandra, Pitonisas, um Cavalo de Tróia, uma verdade uma mentira e muitos enganos.
E quando tudo isto se une numa mesma história, num único espaço temporal, e damos por nós a viver muito além da ficção, muito além do que acreditámos durante tanto tempo como verdade. Quando um encontro muda a nossa vida, a põe de cabeça para baixa, quando um segredo se torna em várias verdades, quando magoamos personagens que na nossa história estavam no lugar errado á hora errada. Quando encontros e desencontros moldam os nossos dias. Quando vivemos em dois mundos e de repente eles se cruzam e os príncipes se tornam vilões, os confidentes em marionetas, as setas disparam em todas as direcções, e as revelações não cessam.
E quando pensamos que a história acabou e vamos fechar o livro, sair da sala de cinema ou abandonar a exposição, a vida continua para além de tudo o que nos aconteceu. Em que há feridos que continuam feridos, há mortos que jamais serão ressuscitados. Nós actores, sem papel, das nossas vidas perdidos com todos os filmes, livros, quadros e fotografias às costas sem saber como continuar, porque não nos explicaram o que vem depois.
Existe um êxtase em viver que nos perde e existem histórias que na ficção só são reveladas no fim quando a personagem morre. Como continuamos depois de tudo isto, como explicamos que a nossa vida ultrapassou tudo o que a ficção mostra? E nós actores de um papel nosso fomos seduzidos pela nossa própria vida e pela espectacularidade do que nos acontecia. Como personagens vivemos cada momento bom e mau, e como espectadores ficávamos fascinados com tudo o que acontecia, com o como acontecia.
É terrível a vida ultrapassar a realidade.

1 comentário:

Clai disse...

lindo ;) é óptimo quando a vida ultrapassa a nossa realidade. é sinal que estamos vivos, que nos surpreendemos, que sentimos, que gritamos, choramos, rimos. sempre na esperança que o sol amanhã vai nascer de novo.