terça-feira, 27 de janeiro de 2009

À Janela do Mundo


Quais serão os cheiros do Mundo?
Para ele, o da Terra molhada depois de chover. Para ela, a terra seca e queimada pelo sol numa planície. Para o marinheiro, o mar revolto de um dia de inverno e para a sua mulher a maresia calma de uma noite de Verão. Para os namorados, a noite pintalgada de estrelas intermitentes, para os solitários os pinheiros no Natal e para a beata o rosmaninho na Páscoa. Todos têm os cheiros dos momentos que os abraçam em cada recordação.
O meu Mundo tem cheiros que outros mundos não sabem sentir. Tem terra, papel, tintas, bordados, torradas, mantas, sopa, lareiras, água de um chuveiro, patos num lago, botões de rosa, laranjas e morangos, pessoas em esplanadas, risos dos que amamos, olhares...
Todos temos um cheiro que vai mais além, que se transporta e nos transporta para um Mundo tão conhecido, como privado.
De todos os sentidos o olfacto leva-nos mais rápido e eficazmente para o mundo das emoções e dos sentimentos, como uma melodia que nos acolhe nos seus braços ou um filme que nos faz chorar.

E se o mundo não tivesse cheiros?

Filipa Pais canta À Porta do Mundo, onde “ por trás de tudo o que importa, vem um sentido para a vida”. Pensar que as portas que não existem estão na nossa memória como janelas que não fechamos, por onde os cheiros entram, contra a nossa vontade, e arrastam consigo todas as memórias. Os cheiros dão-nos o sentido do passado, das viagens que fizemos, das pessoas que conhecemos, do que sentimos quando volta à memória o cheiro dos nossos avós. Nenhum cheiro aponta para o Futuro, porque eles são o nosso passado mais certo. Basta pensar que a arte ainda não consegue captar no imediato a nossa memória olfativa, numa janela aberta de Pierre Bonnard.

1 comentário:

Filipe disse...

Eu gosto dos cheiros todos aqui descritos.