sexta-feira, 20 de fevereiro de 2009

O Espelho de Pandora

Duas coisas que sempre me fascinaram foram caixas e espelhos. Talvez seja porque uma esconde na ânsia de ser descoberta e a outra mostra a nossa vontade de nos escondermos.
Caixas de perfumes que já acabaram, de sapatos que guardam outros sapatos, a das bolachas com uma única bolacha e as outras. Porque será que tão poucos presentes ainda vêm dentro de caixas? E o que escondemos nós lá?
Cartas de amor, convites e bilhetes de uma ida ao cinema e de cujo filme nem nos lembramos, um papel rasgado com uma nota ainda mais rasgada. As fotografias que não queremos que ninguém veja, segredos, indiscrições que não queremos perder. Um chocolate que abandonamos numa caixa só para que tenhamos o prazer de o encontrar. Cada caixa é um mistério eterno, porque fechada ela representa a nossa ânsia de sermos abertos, de que nos descubram aos poucos ou por inteiros. Porque temos caixas ao fundo dos nossos roupeiros ou debaixo da cama? Podíamos fechá-las com chaves, mas nem isso queremos, senão porque seriam de papel?
Já o espelho é o contrário. Escondemo-nos sempre atrás de um espelho. Cabelo penteado, maquilhagem, roupa engomada, a mancha no dente que disfarçamos quando treinamos o sorriso. Escondemos quem somos para que não nos descubram. Não podia estar o espelho dentro do roupeiro, lá ao fundo, ou debaixo da cama? Porque haverá um prazer sem igual ao de nos perfumarmos em frente ao espelho? Que cheiros ou que desejos queremos esconder atrás do nosso perfume?
Edward Burne Jones pintou a sua Vénus ao espelho, na água, Velázquez deitou-a nua ao espelho, o que enfureceu uma feminista. Porque se esconde sempre o amor ao espelho e o guardamos invariavelmente dentro de uma caixa?

1 comentário:

lcata disse...

Ainda bem que existe essa caixinha naquele sitio que só nós é que sabemos.Sabe muito bem abri-la relembrar o passado e continuar a sonhar...